Após a recente decisão do STJ de aprovar o matrimônio civil de duas mulheres gaúchas que viviam há cinco anos juntas, alguns meios de imprensa afirmaram que a sentença iria fixar jurisprudência para o futuro. Em diálogo com ACI Digital, o advogado e perito em temas de família, Danilo Badaró Mendonça explica que esta decisão pode indicar uma tendência, mas não tornou-se a norma para os juízes.
Nesta terça-feira (25), em decisão inédita, o Superior Tribunal de Justiça em Brasília autorizou que um casal de lésbicas do Rio Grande do Sul pudesse casar-se pelo civil. A decisão esteve baseada em uma anterior sentença do Supremo Tribunal Federal, que em maio deste ano reconheceu a união entre pessoas do mesmo sexo como união estável, mas não havia chegado ao ponto de aprovar a permissão para contrair matrimônio civil com todos os benefícios que gozam a união entre homem e mulher.
Segundo informa a nota do próprio site do STJ “seguindo o voto do relator, ministro Luis Felipe Salomão, a Turma concluiu que a dignidade da pessoa humana, consagrada pela Constituição, não é aumentada nem diminuída em razão do uso da sexualidade, e que a orientação sexual não pode servir de pretexto para excluir famílias da proteção jurídica representada pelo casamento”.
“Por consequência, o mesmo raciocínio utilizado, tanto pelo STJ quanto pelo Supremo Tribunal Federal (STF), para conceder aos pares homoafetivos os direitos decorrentes da união estável, deve ser utilizado para lhes franquear a via do casamento civil, mesmo porque é a própria Constituição Federal que determina a facilitação da conversão da união estável em casamento”, afirmou o ministro Salomão na nota do portal web do STJ.
Para melhor entender a situação uma recente matéria de 26 de outubro do Jornal Nacional explica as diferenças entre união estável e casamento: “Para começar, só casando no papel se muda o estado civil de solteiro para casado. A união estável não permite que um adote o sobrenome do outro, como ocorre no casamento. No caso de herança, o cônjuge casado tem direito a pelo menos 1/4 dos bens do outro, garantia que não existe na união estável. E só na união estável é possível excluir o parceiro da herança por meio de um testamento”, afirma o JN.
Depois de certas interpretações da imprensa de que as sentenças do STF em maio e a da Quarta Turma do STJ fixariam jurisprudência para os casos de uniões homossexuais (passando a ser a norma para os casos no futuro), o perito Danilo Badaró, explicou à ACI Digital que a decisão do Superior Tribunal “não gera jurisprudência, pois jurisprudência significa um conjunto de decisões no mesmo sentido. Até agora, há somente essa decisão isolada”.
“Trata-se, sim, de um precedente que reforça o argumento a favor do casamento gay, mas os juízes e tribunais são livres para decidirem o contrário”, acrescentou.
Badaró sublinha que por enquanto “não é possível afirmar que foi legalizado o “matrimônio” gay no Brasil”.
“A decisão se refere apenas ao casal de lésbicas que eram partes no processo e não tem efeito para além das partes. Eu termos jurídicos, o efeito é inter partes e não erga omnes (válido para todos)”, destacou o advogado e professor de direito da Estácio de Sá em Petrópolis-RJ.
“Na verdade, cada vez mais união estável (entre homem e mulher) e casamento (entre homem e mulher) têm sido tratados como equivalentes, havendo pouquíssimas distinções. Uma vez que o STF reconheceu a união entre pessoas do mesmo sexo como união estável, praticamente já igualou com o casamento”, frisou o perito.
“Portanto, acho muito maior a relevância da decisão do STF (que, aliás, é decisão superior em relação à da quarta turma do STJ). A decisão do STJ, é uma decorrência da decisão do STF, significa um grau de institucionalização maior, praticamente igualando essas uniões às relações conjugais dando-lhes direito à herança, alteração do sobrenome, alteração do estado civil, etc”.
Em sua entrevista à ACI Digital desde Petrópolis, o Prof. Danilo também alerta que a partir destas sentenças “a tendência é a equiparação total, incluindo a adoção de crianças”.
“O que se pode dizer é que a decisão é um passo a mais no reconhecimento do casamento entre homossexuais. A partir de agora, um casal homossexual vai a cartório para se casar. O tabelião vai suscitar dúvida para o juiz, já que não há previsão legal. O juiz responderá ao tabelião que é possível, usando os mesmos argumentos do STJ, ou decidirá que não é possível por falta de previsão legal. Se o juiz decidir que é possível, o tabelião faz o casamento”.
“Se o juiz decidir que não é possível, o casal gay entrará com recursos para os tribunais, até uma decisão final que não está vinculada à decisão do STJ, mas que provavelmente será no sentido da possibilidade”, concluiu.
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