ASSIS, – Todos os líderes religiosos que participaram do Dia de Reflexão, Diálogo e Oração pela paz e a Justiça no Mundo, promovida no último dia 27 em Assis, na Itália, aplaudiram a iniciativa do Papa e ressaltaram a importância de rezar e dialogar pela paz.
O patriarca ecumênico de Constantinopla, Bartolomeu I, afirmou que o diálogo deve levar a “considerar o outro como sujeito de relação e não como objeto de indiferença”, “porque é na indiferença que nasce o ódio, o conflito, a violência”.
“Contra esses males, só o diálogo é uma solução possível e de longo prazo”, observou, recordando que “não vivemos apenas uns contra os outros, ou uns do lado dos outros, mas principalmente uns junto com os outros, em espírito de paz, de solidariedade e de fraternidade”.
“Os responsáveis pelas religiões devem se encarregar do processo de restabelecimento da paz. Não é simplesmente verbal. Ele exige que sejamos fiéis à nossa fé, fiéis ao desígnio de Deus para o mundo, respondendo ao que Ele quer”.
O doutor Rowan Douglas Wichams, arcebispo de Canterbury, cabeça da Igreja Anglicana, definiu como “uma grande honra” celebrar o aniversário da primeira Jornada de Oração pela Paz, promovida pelo beato João Paulo II.
Uma paz duradoura, segundo ele, “começa onde nós vemos o próximo como a nós mesmos e quando começamos a entender por que e como devemos amar o próximo como a nós mesmos”.
Os cristãos, especificou, reconhecem no próximo “não só alguém que tem em si 'a imagem de Deus' em virtude da criação, mas alguém que tem em si também a semelhança de Jesus Cristo em virtude da nova criação”.
Assim, “não somo estranhos uns aos outros. E temos que encontrar o modo de concretizar este reconhecimento recíproco em relações de amizade verdadeiras e duradouras”.
O doutor Olav Fykse Tveit, secretário geral do Conselho Ecumênico das Igrejas, louvou o encontro de Assis destacando que “o mundo precisa de reuniões entre os chefes das comunidades religiosas”, assim como de “construtores de paz a partir da fé”.
Recordando Jerusalém, Tveit anunciou que, para o Conselho Ecumênico das Igrejas, “um compromisso preciso para os próximos anos será o de trabalhar por uma paz justa em Jerusalém” e para todos os povos que vivem na cidade e em torno dela. “Somos responsáveis diante de Deus, e uns diante dos outros, pela paz do nosso tempo e também pelo que dizemos ou não dizemos para alcançá-la”, declarou.
Por sua vez, o rabino David Rosen, diretor do departamento de Assuntos Inter-Religiosos da American Jewish Committee(AJC), começou falando do conceito de peregrinação. “Uma peregrinação é, por definição, muito mais que uma viagem. As palavras hebraicas para peregrinação são 'aliyah a’regel', expressão que significa 'subida a pé”, um conceito que tinha um significado tanto literal como espiritual: literal porque subia-se dos montes de Judeia até o Templo de Jerusalém, e espiritual, ou simbólico, no sentido de subir rumo a Deus.
“Este conceito de peregrinação, de ascensão, é central na visão profética do estabelecimento do Reino dos Céus na Terra, a visão messiânica de paz universal”, completou Rosen.
Rosen retomou ainda um comentário do grande rabino Meir Simcha de Dwinsk, que viveu há um século, falando sobre a diferença entra a paz da arca de Noé e a visão profética de Isaías. No primeiro caso, a paz era a única possibilidade, e na visão de Isaías ela nasce do “conhecimento do Senhor”, surgindo da mais íntima compreensão espiritual e da livre vontade.
“Para muitos no mundo, a paz é uma necessidade pragmática, e isto é verdade”, observou Rosen, mas a paz que os homens e as mulheres desejam é outra: é “subir à montanha do Senhor”, ou “uma idéia de paz como expressão sublime da vontade divina e da imagem divina em que todo ser humano é criado”. Homenageando o beato João Paulo II, e expressando gratidão ao seu sucessor Bento XVI, o rabino recordou os sábios do Talmud. “Eles ensinam que a paz não só é em nome de Deus (…) mas também é o requisito indispensável para a redenção”.
Diferente foi o enfoque do secretário geral da Conferência Internacional dos Estudiosos Islâmicos (ICIS) e ex-presidente da Nabdlatul Ulama (NU), o indonésio Kyai Haji Hasyim Muzadi. Sua reflexão começou com a constatação de que “muitos problemas entre os homens nesta terra vêm dos que seguem uma religião”, mas isto não significa “que os problemas que surgem entre os homens que pertencem a uma religião sejam originados pela religião em si”.
Para o expoente muçulmano, o que gera conflitos e tensões é o simples fato de que “as religiões autênticas” “podem ter seguidores que não são capazes de compreender o seu caráter saudável de maneira plena”, uma carência que pode levar “à distorção da religião”. “Toda religião possui identidade própria”, mas “um caráter comum de toda religião é a esperança para a criação de harmonia entre os homens, paz, justiça e prosperidade e um melhor nível de vida”.
Sua receita para chegar “a uma harmonia e coexistência duradouras entre as religiões” é simples: “Não se deveria mudar o que é diferente, nem impor os pontos de vista que não se compartilham”. O delegado muçulmano também abordou o perigo de instrumentalizar a religião. “Nosso dever, como comunidades religiosas, é levar a todos os crentes a liberdade de compreender de verdade o próprio destino, e de corrigir as visões equivocadas das religiões que levam a conflitos sociais”.
A representante dos “não crentes” ou agnósticos, Julia Kristeva, preferiu começar sua reflexão com as conhecidas palavras de João Paulo II: “Não tenhais medo!”. Segundo a filósofa e psicanalista, estas palavras não são voltadas apenas aos crentes, porque incentivavam todos a resistir ao totalitarismo. “O chamamento desse papa, apóstolo dos direitos humanos, nos encoraja também a não temer a cultura europeia, mas, ao contrário, a ousar o humanismo”.
“Diante das crises e das ameaças que se agravam, chegou a idade da aposta”, continuou a francesa de origem búlgara. “Ousamos apostar na renovação contínua das capacidades de homens e mulheres de crer e conhecer juntos, para que no 'multiverso' de vazio, a humanidade possa perseguir ainda o seu próprio destino criativo no longo prazo”, concluiu.
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